terça-feira, 2 de outubro de 2007

Coisas que a gente não entende...

- Por favor, encoste a porta ao sair.
- Posso pegar minhas coisas mais tarde?
- Eu deixo tudo numa caixa na portaria...
- Ahn... obrigada, então...
E não disse mais nada. Não sabia o que dizer mesmo sabendo que havia mil coisas não ditas que precisavam ser esclarecidas. De que adiantava agora lembrar das besteiras já feitas? E das não feitas... Talvez essas doam mais... Apenas porque ficarão pra sempre engasgadas.
Ameaçou voltar, mas sabia que não era certo. Parou. O que diria? Mais uma besteira não feita pelo simples fato de ser besteira. Mais uma engasgada.
Lá dentro, ainda sem entender o que aconteceu, chorou. Chorou pela incerteza do futuro, chorou porque não sabia o que fazer. Chorou porque o fim era sinônimo de choro. Chorou porque era assim que todos queriam que agisse. Porque ninguém PODE sorrir num momento desses. Porque não escolhemos o que vamos sentir.
Poucas lágrimas foram derramadas, talvez porque o tempo estivesse seco, ou porque tinha sono. Dormiu. Sem sonhos, afinal, sonhar era pra poucos...
Descendo as escadas devagar, lembrou-se que ainda estava com a chave do apartamento. Para que? Nunca mais poderia entrar, afinal, seu lugar não era mais lá. Pensou em voltar e devolver as chaves, mas na verdade sabia que só queria saber; saber o que? Achou melhor entregá-las ao porteiro.
- Mas e as suas correspondências, entrego a quem?
- Eu mando alguém vir buscá-las de vez em quando, até eu saber direito pra onde vou...
- Tudo bem... mas aconteceu alguma coisa?
Porteiros sempre querem saber o que aconteceu. Sorriu e deu tchau. Não abriria sua intimidade assim tão fácil. Ou era o medo de contar e, assim, ter de assumir o fim?
Deixou seus pensamentos ir além. Viajou por ruas, lugares, lembranças. Até as brigas parecem boas quando tudo acaba.
E será mesmo que o fim é tão ruim assim? Sempre reclamamos disso e daquilo, mas quando acaba, nos lembramos do relacionamento perfeito. Seria essa a única forma de eternizá-lo? Seria, assim, só no prazer de ficar triste ao lembrar de que era feliz?
Notou, então, que estava andando sem rumo. Pra onde iria? Morou por tanto tempo naquele lugar que parecia o único lugar seguro no mundo inteiro. Teria que se acostumar com isso, não era mais.

Ainda não havia entendido por que ele a havia convidado para conhecer seu apartamento novo. Era grande, bem mais espaçoso que o dela. Bonito. Aconchegante. Com cara de lar.
Comentou que ele se virara bem sozinho arrumando tudo. Ele disse que seria maldade não confessar que tinha recebido ajuda. Ela ia perguntar de quem, quando notou toques femininos na decoração. Ele não ficaria mesmo muito tempo sozinho. A campainha tocou.
- Devem ser meus amigos!
- O pessoal do futebol?
- Não, a galera que eu conheci em uma viagem que eu fiz nas férias. Não te contei? Enfim, tirei aquelas férias... E fui relaxar um pouco no Nordeste...
- Nordeste? Hmm... que bom! - não conseguia disfarçar sua inconformidade com aquilo.
- E aí, cara? Tudo bom?
- Fala, pessoal. Deixa eu apresentar pra vocês... Essa é minha... ahn... minha amiga Carla.
- Ah, aquela Carla que... que você comentou?
- É, é sim - ela nunca tinha visto ele tão ruborizado.
- Prazer. Bom, acho que eu já vou. Tenho muitas coisas pra fazer, sabe? Muita atarefada com o trabalho... - sorriu quase simpática.

Queria correr, mas não podia. Queria chorar, mas a gente não pode fazer tudo o que quer na hora que deseja, né?
Chegou em casa, apressada. O que faria agora? Por que aquele apartamente de um dormitório parecia tão enormemente vazio?
Lembrou-se de tudo de bom que tinham vivido juntos. A viagem que eles sempre planejaram, mas ela, sempre com pressa, nunca pode fazer porque não podia tirar aquelas férias. Chorou. Chorou porque sentia dor. Chorou porque sentia-se só. Chorou porque não tinha nem um gato pra acariciar enquanto comia chocolate e assistia 'Um Lugar Chamado Nothing Hills' sozinha, largada no sofá.

Quando todos foram embora, percebeu que ainda gostava dela. Mas percebeu que sua vida era melhor assim. Nem sempre o que o coração quer é o que nos faz feliz de fato.

6 comentários:

Vandson disse...

Ah, desencana. Esse negócio de coração só dá errado.
Por isso que eu sou assim: Frio, insensível e sem alma(...)
bjos

Lia Lupilo disse...

humm...
eu sei que o vãdsô ainda acredita no amor

Lia Lupilo disse...

desculpa o comentário inútil acima,
mas quem sou eu pra falar de coisas do coração? x-]

beijos, querida =0**

Tatiane Ribeiro disse...

Lia, minha querida...
Quem somos NÓS para falar de coração... não deve existir ninguém realmente apto para tal tarefa... mas eu ainda insisto...

E eu tb acho q o Vãdsô acredita no amor ainda... ;)

Vanessa disse...

"Queria correr, mas não podia. Queria chorar, mas a gente não pode fazer tudo o que quer na hora que deseja, né?" ". Nem sempre o que o coração quer é o que nos faz feliz de fato."
Desculpa a minha liberdade poética aplicada em comentários de blog, maaas, não pude deixar de fazer essa pequena marcação nas frases já ditas. Pois não, de todos esses sentimentos que envolvem uma despedida, acredito que o pior seja o silêncio. E não por não ter mais nada a falar (chega uma hora que tudo cansa), ou por você ter raiva ou qualquer outro sentimentozinho guardado, mas porque o silêncio é tão perfeito que você não ousaria quebrá-lo com palavras imbecis.
Chore, meu bem. Porque o choro lava a alma, acalma o coração. Chore, porque você sempre terá ouvidos que não precisam escutar nada para entender, ombros que não precisam estar sempre por perto para saber que estão sempre ao seu lado e sorrisos abertos e sinceros para tentar alegrar ao menos um pouco a sua vida. Chore, meu bem, porque o primeiro passo (nem que seja de recomeço) sempre se dá com uma lágrima, seja de felicidade, de decepção, de infelicidade, de solidão ou qualquer outra coisa. Tudo começa quando a morte, uma despedida, uma lágrima, um dia, encerra o ciclo natural de vida.


(e é tão mais gostoso escrever quando nem tudo é verdade! )

Tatiane Ribeiro disse...

Vanessa: Vc tem td a liberdade poética do mundo nesse blog! ;)

Sim... prefiro quando nem tudo é verdade. Talvez pq exista mais verdade nessa parte do que na outra. Aí, encaixando é com pudesse ser, tudo fica mais perfeito...

"Depois de algum tempo você aprende a diferença, a sutil diferença, entre dar a mão e acorrentar uma alma. (...)
E começa a aprender que beijos não são contratos e presentes não são promessas."